terça-feira, 3 de maio de 2016

Existem contradições, casos a partes, números irrelevantes, quase invisíveis, como anões no meio de gigantes. Mas tenhamos bom senso, a vida de um simples parafuso não é nada fácil.
Somos um em bilhões, indiferentes, muito parecidos. Descartados, usados para prender grades de prisão, no meu caso. E quando nos chega a velhice, estamos fracos e frágeis, enferrujados, como um trabalhador desempregado, com a tristeza de ser ainda mais inutilizado, pouco escutado, tão pouco enterrado.
Ainda somos obrigados a fazer parte do trabalho dos martelos. Enormes martelos. Terríveis, esnobam sua imortalidade, alguns feitos de madeira, outros metal, encapados por borracha, segurados por grandes marceneiros. Filosofando, o martelo é de tamanha importância, pelo menos muito mais que nós, que se tem apenas um, dois no máximo em seu estoque. Seus preços chegam a ser quase 100 vezes maior que o de um parafuso.  Enquanto estamos misturados em um saquinho, todos grudados um no outro, suando naquele cruel pedaço de plástico, fechado, então pouco deixando entrar oxigênio.
Eh difícil ser um parafuso. Aposto que nenhum de vocês desejaria isso para seu futuro. Então da próxima vez que for parafusar sua parede, pense nos seus vizinhos.

quarta-feira, 13 de abril de 2016

A cRise

(Meu nome é Geraldo)

Meu nome é Geraldo. Tenho 5 anos, nascido em São Paulo, e adoro comer, pular e dormir. Gosto de comer restos de amoras, aquelas que sobram nos mercados são maravilhosas, porem, as que caem do pé de amoreiras, essas não tem comparação. Sou, a mais nova peste, o Aedes Egipt, conhecido pela transmissão da dengue, vírus terrível. Não gosto de ser assim, ter essa fama de malvadão, não posso nem sair de casa que corro risco de morte, fora que hoje em dia, já não da para bobear, tem lugares cheios daqueles sprays que matam. Falando em casa, lembro-me de meu melhor amigo.
Bingo, um pernilongo de pernas curtas,  – coitado, seus amigos fazem bulling com ele -  não gosto muito deles, os acho um pouco assustadores com aquelas enormes patas. Mas bingo é parecido comigo, um pouco inocente, também não pica ninguém. Tenho inveja dele, que ostenta sua linda casa, florida e cheirosa, e as vezes vem me contar das visitas. – Malditas abelhas, lindas, exuberantes, apaixonantes... – Não posso pensar muito nelas, que já até sinto seus cheiros. E ainda por cima, ele mora no vaso de flores da tia Joana, que é em frente a cerejeira, gostosas cerejas. Tudo isso, enquanto eu aqui, morando no pneu furado que os carros deixam, cheio d’agua dentro. Preciso de um par, não vejo a hora de me casar, conhecer a família, ir buscar a noiva na casa dela para ir para lua de mel.
AI! Esqueci de contar para vocês, falando em buscar a noiva né, hoje que eu vou tirar minha carta, só assim para eu poder voar, e busca-la.
Cheguei 5 min mais cedo, e toquei a campainha:
- Quem deseja?
- Vim fazer o teste, é aqui a casa da Joaquina, não é?
Era ela mesmo quem abria a porta. E  já foi anotando – Geraldo, 9h30, carteira - . Cheguei no final do teste de Romeu, meu vizinho, gostava dele também, mesma espécie, mesmos gostos. Ele havia conseguido, segundo ele, era seu terceiro teste, nos outros tinha ido mal.
Deu horário de meu teste, fui para o ponto de partida. Bartolomeu, uma das quatro crianças da casa gritou:
- Vai, agora!
Tive de ir, não tinha como voltar atrás. Sai voando rápido na direção correta, e sem nem piscar, já me apareceu o primeiro obstáculo. Jaiminho, filho mais novo de dona Joana, esse seria mais fácil de passar, fora sua pouca experiência, suas mãos eram bem menores, pequenas ainda.
- Pa, Pum, Pim – passei sem muita dificuldade.
Veio o do meio, João, já mais velho e amadurecido, idade ainda da puberdade, nem tão difícil, nem tão fácil.
- Pum, Pim, Pa – passei são e salvo, faltava o mais difícil.
            E veio sem nem dar chance de eu pensar um pouco, Julião era ENORME, não ia ser nada fácil.
            - Pim – passei – Pa – passei raspando, senti o toque na ponta de seu dedo- Pum!
            - Conseguiu Geraldo, aqui esta sua carteira, pode buscar a noiva! 

Fazendo crônicas baseadas em outras crônicas.

          Ter ou não ter um irmãozinho Ter um irmãozinho. Ter um irmãozinho tem muitas consequências, por isso pense duas vezes antes de fazer aquele breve pedido – Mãe, me dá um irmãozinho -, pois é, tem o seu lado ruim. Mas vamos começar pelo lado bom das coisas, pensar no copo quase cheio.
         Ele te traz alegria, felicidade, muita fofura e animação, vontade de viver. Aquela hora em que você está no sofá entediado no celular, e ele vem rindo fazer o pedido para ir brincar.  Te faz rir de monte quando conta aquelas mentiras cabeludas que você finge acreditar para deixar ele feliz. Ou quando ele chora porque perde em todos os jogos que tentam jogar e você faz de tudo  para deixar ele ganhar, mas o coitado não é tão burro quanto você pensa, e reclama da sua forma de tentar fazer ele mais feliz. 
         Ah, é tão bom ter um irmãozinho, quando todos então brigando e a casa está em caos, ele está pedindo calma. Quando você fala o palavrão e ele te corrige mostrando que ainda é educado, que nem você era quando tinha aquela idade. São muitos os lados bons dessas convivências.
         E quando você assusta ele e depois se arrepende, ele chora e fica assustado durante semanas.  Quando ele pede para dormir do seu lado, é de enlouquecer, no bom sentido. Ou quando ele pede comida na boca e você mesmo cansado faz esse favorzinho. Eles te ensinam muitas coisas.
         Inclusive te ensinam que você erra muitas vezes, e que cometeu um grande erro em pedir a sua mãe – Mãe, me dá um irmãozinho -, um grande erro. A parte ruim chegou, e é as vezes maior que a parte boa. 
        Imagina quando você está no sofá entediado mexendo no celular e ele vem te chamar para  brincar, brincar não, já vem te batendo e chamando para luta. Tira seu tênis e faz cócegas em seu pé, no dia em que  mais está mal humorado. A parte ruim,  é que eles não sabem distinguir sim e não, para e continua, sempre e nunca. Então quando você diz – não pega o controle e muda o canal – ele pega o controle e bota no Discovery kids, na hora da música dos backardigans. E você diz – Brincadeira de mão NÃO dá certo – ele sempre vai te contrariar, pegando um rolo de papel filme, e batendo com força. Tem os irmãos do contrário, você diz sim, eles sempre dizem não, você quer e eles não querem.
         No final seu irmão mais velho, passou por isso, você já foi um deste pirralhas preferidos, e eu aconselho a todos, que passem por essa experiência, e pode ter certeza, vai ser a mais épica e a mais aterrorizante de sua vida.

sexta-feira, 8 de abril de 2016


Felicidade
Felicidade. Queria ouvi-la, vê-la.
Para mim, felicidade não é apenas a ausência da tristeza, é muito mais que isso. É quando a criança, ao tirar a peruca de seu avô e ver sua careca, abre aquele imenso sorriso. Ou o menino que escancara um grande orgulho ao ser vacinado sem chorar nenhuma gota sequer. Também tem a garota que demonstra timidamente uma grande satisfação quando percebem que cortou seu cabelo em 2 cm.
Praia, sinônimo de felicidade. Se tem algo que sobressai a todos os exemplos de felicidade que citei, é a praia. Seu silêncio grita, maré que sobe, maré que desce, felicidade ao extremo. Lugar onde não entram problemas, onde tudo se esquece, seu trabalho, sua tristeza, suas loucuras, tudo é esquecido, como se existisse uma barreira, um sensor de problemas como os de aeroportos que bloqueiam explosivos e metais. É Assim que me sinto quando vejo a linha que separa o mar do céu.
Um menino me observa. Sentado no sofá oposto ao meu, numa linha reta onde nossos olhares se cruzam. Ele me observa, e me observa novamente. Um olhar fixo, e atencioso, passando seu olho por todo meu corpo, dos pés à cabeça, sem perder nem sequer um detalhe. Não apenas me observa, mas também anota sem parar as informações em seu caderno de couro preto, pequeno, liso. Gosto de seu caderno, mas me incomoda um pouco a situação, pois nem sequer sei para quais fins usará essas informações.
Um homem pequeno, com sapato de couro preto, uma meia comprida marrom e uma calça jeans bastante esbranquiçada e rasgada na área dos joelhos. Uma leve elevação na barriga. Uma blusa cinza e uma jaqueta também cinza com listras pretas, algo meio hipnotizante. Sua cara tem um formato meio retangular, com bastante nariz, e algumas espinhas concentradas na bochecha. Cabelo curto e preto, orelhas e olheiras. Com calor, e um pouco cansado, espera pacientemente sua comida chegar. Está há uma meia hora esperando, o Sesc está cheio, gente por toda parte. Usa óculos redondo e pequeno, e parece estar um pouco ruim, pois bota o óculos na ponta do nariz e faz um certo esforço para enxergar as coisas. Aparenta uns 37 anos, tem pele branca e sem músculos definidos em seus braços. Tem uma bolsa marrom retrô, meio aberta. Senta com as pernas cruzadas, com uma postura meio largada.
Por um momento ele para de me descrever em seu caderno. Olha para mim fixamente, eu olho para ele, logo ele vira a cara e finge prestar atenção em outra coisa. Deve pensar que ainda não percebi sua perseguição a minha pessoa, infelizmente está enganado. Ele pega seu celular e o desbloqueia. Levanta sua cabeça e olha para sua volta. Olho rápido para baixo, ele não percebe que eu o observo. Ele levanta um pouco seu celular em minha direção, e por fim tira uma, duas, três fotos de minha pessoa.
Quando chega um homem meio gordo, nem alto nem baixo:
- Filho! Terminou? Já podemos ir?
- Sim pai – sussurra o menino. E logo sorri – Obrigado por me esperar. Agora vamos, depois te mostro como ficou. – E dá um beijo na bochecha de seu pai.
Felicidade. Acabo de ouvi-la, vê-la.